Para mascar com chiclets
Quem subiu, no novelo do chiclets,
ao fim do fio ou do desgastamento,
sem poder não sacudir fora, antes,
a borracha infensa e imune ao tempo;
imune ao tempo ou o tempo em coisa,
em pessoa, encarnado nessa borracha,
de tal maneira, e conforme ao tempo,
o chiclets ora se contrai ora se dilata,
e consubstante ao tempo, se rompe,
interrompe, embora logo se reemende,
e fique a romper-se, a reemendar-se,
sem usura nem fim, do fio de sempre.
No entanto quem, e saberente que ele
não encarna o tempo em sua borracha.
quem já ficou num primeiro chiclete
sem reincidir nessa coisa (ou nada).
2.
Quem pôde não reincidir no chiclete,
e saberente que não encarna o tempo:
ele faz sentir o tempo e faz o homem
sentir que ele homem o está fazendo.
Faz o homem, sentindo o tempo dentro,
sentir dentro do tempo, em tempo-firme.
e com que, mascando o tempo chiclete,
imagine-o bem dominado, e o exorcize.
(MELO NETO, João Cabral de. Poesias completas ( 1940-1965) . 4. ed. Rio de
Janeiro. José Olympio, 1986. p. 43.)
O poeta faz uma contemplação do ato de mascar chicletes e como o chiclete e o tempo são semelhantes, pois o chiclete ora se contrai, ora se dilata, assim a nossa percepção do tempo, tem coisas que parece que aconteceram a tanto tempo e outras que parece que foi neste instante.
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